Fernando Savater
Ética para um jovem
Lisboa
Publicações D. Quixote
Tradução Miguel Serras Pereira
Design Atelier Henrique Cayate
- Rita Múrias
158p
Resumo:
Ética para um Jovem
Este livro, cuja leitura iniciei
um pouco antes de abordar Ética em Filosofia, não refere as principais teorias
ou filósofos que “brilharam” nesse campo. Tem, porém, um carácter quotidiano,
abordando de forma simples e perceptível para qualquer jovem, assuntos que
aparentam ser algo óbvios mas sobre os quais não reflectimos
frequentemente.
Fernando Savater, filósofo espanhol, dirige-se neste livro ao
seu filho Amador, tentando cativar e motivá-lo para reflexões sobre ética.
O
escritor começa por invocar o “bem” (aquilo que nos convém) e o “mau” (o que não
nos é favorável) e fundamenta a ideia de que a liberdade é a base de todas as
nossas acções, fazendo também uma breve abordagem ao determinismo. Exemplifica
estas correntes filosóficas com um exemplo concreto: comparando Heitor (o melhor
guerreiro de Tróia), de Ilíada de Homero com as formigas térmitas-soldado, que
protegem a sua tribo por instinto animal, ao contrário de Heitor, que é livre de
escolher lutar ou não. A sua definição de Ética é, neste capítulo “a arte de
viver”.
Savater insiste na noção de liberdade, referindo que nem sempre
fazemos aquilo que queremos devido às circunstâncias que se impõem e que há
diferentes motivos (“razão que tens ou pelo menos julgas ter para fazer alguma
coisa”) que nos levam a agir, havendo três tipos diferentes de motivos: ordens
(o que nos obrigam a fazer), costumes (hábitos) e caprichos (vontade impulsiva e
momentânea). Menciona que os motivos têm pesos diferentes conforme as
circunstâncias e que, por vezes, devemos agir autonomamente sem seguir ordens ou
costumes e pondo de parte os nosso caprichos. É necessário analisar a fundo o
que se faz, tendo raciocínio próprio e sabendo avaliar se uma acção é ou não
positiva.
O segredo para praticar o bem é então agir em função de ter uma
vida boa. Para isso, é necessário ter uma visão a longo prazo, tendo noção
daquilo que será benéfico para nós mais tarde e não no instante (capricho). O
autor dá-nos um exemplo bastante interessante da Bíblia, uma história de dois
irmãos. Jacob, o herdeiro de uma fortuna, troca essa herança com o irmão Ésau
por um prato de lentilhas, visto que se encontrava com fome após uma ida ao
campo. Esta acção trouxe-lhe uma sensação de satisfação após ter comido a
refeição mas rapidamente se arrependeu. Devemos sempre ponderar os nossos actos
sendo imparciais relativamente às circunstâncias actuais.
É também
evidenciada a ideia de que a vida boa implica socialização. É necessário que
tratemos os humanos como pessoas, nunca os subvalorizando. Caso contrário,
apoderar-se-á de nós uma enorme solidão que impedirá a boa vida. Partindo do
exemplo do filme Citizen Kane em que Kane é um multimilionário que durante toda
a sua vida usou as pessoas como um meio para alcançar riqueza. No fim da vida,
morre sozinho proferindo a palavra “Rosebud”, um nome escrito no trenó com o
qual Kane brincara durante a infância. São os acontecimentos com uma elevada
carga emocional que realmente têm importância e não os bens materiais,
facilmente substituíveis.
“Sabes qual é a única obrigação que temos nesta
vida? Pois é a de não sermos imbecis”. Fernando Savater enfatiza o papel da
consciência, o contrário da imbecilidade. Por consciência, entendem-se os
seguintes aspectos: não ser passivo , “saber que nem tudo vai dar ao mesmo”;
analisar cuidadosamente o que nos rodeia, assumirmo-nos livres e responsáveis
pelas consequências do que fazemos. Uma das partes que me chamou mais a atenção
ao longo do livro foi a sua análise ao egoísmo: “Só deveríamos chamar egoísta
consequente àquele que deveras sabe o que lhe convém para viver e se esforça
para consegui-lo. O que se entrega a tudo o que lhe causa mal gostaria, no
fundo, de ser egoísta, mas não o sabe”. As consequências que as más acções
acartam nunca são tão dolorosas como os remorsos, o peso da consciência, que
inexplicavelmente pesa sobre nós e nos persegue sem que sejamos perseguidos por
mais ninguém, o que só acontece pela noção presente de que somos livres e de que
a nossa liberdade não foi bem usada. Contudo, devemos afirmar-nos responsáveis
por qualquer acção, pois “cada um dos meus actos me vai definindo, me vai
inventando”.
O filósofo insiste na ideia de “pessoa”, atribuindo um dos
princípios básicos da Ética à empatia: é necessário pormo-nos no lugar dos
outros, daqueles que a nós são semelhantes (humanos), visto que isoladamente,
não há qualquer necessidade de ter em consideração os interesses dos outros. Um
imperador e filósofo de Roma, Marco Aurélio, dizia para si próprio: “Quando hoje
te levantares, pensa que ao longo do dia te vais encontrar com algum mentiroso,
com algum ladrão, com algum adúltero, com algum assassino. E lembra-te de que os
deves tratar como homens, pois são tão humanos como tu e são para ti
indispensáveis como o maxilar inferior o é para o superior”. Sem o contacto
humano, não seria possível viver humanamente. É necessário levar o próximo a
sério mesmo que nem sempre os seus actos sejam dignos. Só assim se instalará o
bem.
São também referidos os diferentes tipos de prazer e o facto de que não
há que recear o prazer ou fiarmo-nos em preconceitos do género. Mesmo que o
prazer nos distraia, não quer dizer que algo seja mau só por nos agradar.
Devemos aproveitar o melhor da vida, “Carpe Diem”. São diferenciados os prazeres
que nos destroem e nos retiram dignidade (vícios) dos que nos causam alegria mas
não ao ponto de cairmos no desgosto, havendo assim temperança e
autonomia.
Savater conjuga os conceitos “ética” e “política” (tendo também
uma obra intitulada de Política para um Jovem), dando a esta uma ideia de
colectividade associada ao bem comum, baseando-se também nas ideias de justiça,
igualdade…
Por fim, é sugerido ao leitor que crie o seu próprio modelo de
vida boa (lei universal e autónoma), visto que não há nenhum “molde” a seguir,
chamando-se o Epílogo Terás de ser tu próprio a pensar, no qual se encontra a
seguinte citação de Luncien Leuwen: “Adeus, leitor amigo; tenta não gastares a
tua vida a odiar e a ter medo”.
Agradou-me imenso a leitura deste livro, não
só pelos exemplos concretos associados às ideias principais mas pela
simplicidade, sequência e lógica do texto. Foi extremamente enriquecedor e
suscitou-me momentos de reflexão, pelo que pretendo ler mais obras de Fernando
Savater.
"...E se a solidão for completa e definitiva, todas as coisas se
volvem irremediavelmente amargas."
Exemplar como novo, miolo limpo, capa e lombada em excelentte bom estado, pouco manuseado.
Preço : 15 €
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